Com seu jeito especial de contar histórias, o jornalista Paulo Francis tinha uma que ilustrava o respeito que os americanos devotavam à correspondência e aos serviços dos correios. Certo dia, escrevera uma carta em que enumerava um conjunto de razões para não atender a um pedido que lhe haviam feito. Eram tempos pré-email. Desceu do apartamento e a depositou na caixa de correio da esquina. Quando chegava em casa, de volta, lembrou de uma frase importante que havia esquecido de botar na carta. Correu à esquina e deu de cara com o carteiro, que já tinha transferido o conteúdo da caixa para sua sacola e tratava de passar o cadeado. Francis explicou o que se passava e pediu a carta de volta. Afinal, era só o postman enfiar a mão no malote e resolver a questão. Mas tudo o que obteve foi um respeitoso "desculpe, senhor, mas sua carta agora está sob a guarda do governo dos Estados Unidos".
Conto-lhes isso porque naquelas pesquisas que, ano sim, outro não, mostram o que a população pensa a respeito do Brasil que a cerca os Correios há décadas fazem bonito. Na mais recente – início do ano – alcançou 85% de confiabilidade; acima do real, a moeda que mudou a vida dos brasileiros. Mas como nada no Brasil resiste ao sucesso, na sexta-feira, 11, os Correios conseguiram perder uma camioneta carregada de correspondência. Foi encontrada na segunda-feira, 14, graças ao telefonema de um ouvinte da rádio BandNews FM, que achou esquisito ter um enorme furgão dos Correios inerte e depenado diante de sua casa o fim de semana inteiro. Espiou pelas janelas quebradas e viu centenas de cartas e correspondências diversas espalhadas no interior.
A partir do telefonema, graças à repórter Juliana Ramos, os cariocas ficaram sabendo que nem a empresa sabia do sumiço do furgão. Até as 16 horas da segunda-feira não havia instalado uma operação interna para apurar qual dos seus funcionários tinha perdido para assaltantes um carro com tão preciosa carga, na rua Ari Villar, na Pavuna. Também não havia registro na Delegacia de Roubos e Furtos de Automóveis ou qualquer outra repartição da Polícia Civil. A ECT, Empresa de Correios e Telégrafos, é a mesma que, mês passado, obteve do STF a manutenção do monopólio para o transporte de cartas pessoais e comerciais.
Esse serviço rendeu à empresa 5,7 bilhões de reais em 2008 – metade de seu faturamento. Em defesa do monopólio, o ministro das Comunicações, Helio Costa, teve reuniões reservadas com ministros da Corte. Também disse aos jornais que a eventual entrega da tarefa à iniciativa privada comprometeria o sigilo postal e a obrigatoriedade da entrega. Diante do ocorrido pode-se concluir que sua excelência se presta a qualquer papel, não?
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