do Ponte Aérea
É tão assustadoramente podre a situação da assistência de saúde no Rio que estado e prefeitura podem inaugurar quantas UPAs quiserem que o equilíbrio continuará longe. A gestão é ruim e a mão-de-obra desmotivada e desqualificada. Dezenas de prefeituras trocaram investimento em saúde por ruas asfaltadas. É mais vistoso, dá voto e, na falta, não dá para transferir a culpa. Melhor empurrar o doente para os hospitais da capital.
Aí começa a encrenca. A referência é o Souza Aguiar, que a médica Maria Emília Amaral transformou no maior centro de atendimento de urgências da América Latina. Mas isso foi há 13 anos. Hoje é um lixo. Está possivelmente a caminho de se assumir a liderança em óbitos no continente. Funcionários do hospital relevelam que, nos últimos cinco anos, a média de mortes dobrou: de 100 para 200 por mês. Nada animador, pois não?
A precariedade é tamanha que, nesta sexta-feira, 11, as crianças internadas no CTI da Pediatria começaram a ser transferidas para outros hospitais da rede. Motivo: falta de médicos. Da equipe prevista de 20 profissionais 14 entraram em licença ou pediram o boné porque a cooperativa através da qual recebem salários não vê a cor do dinheiro há quatro meses. Dos seis médicos que sobraram nessa conta nenhum estava escalado para o plantão do fim de semana.
Mas não mora apenas na rede municipal a falência da saúde que se oferece ao carioca. Governos estadual e federal são donos da maior fatia dessa conta. A faina de instalar UPAs para pagar promessa de campanha caminha para circunstância grotesca. Como são unidades ambulatoriais e de triagem, todo paciente cuja doença exige cuidados mais complexos acaba caindo no cenário pré-UPA (falta de ambulância, de médicos, de equipamentos e até de remédios nos hospitais), que não melhorou em nada.
Nos hospitais da rede federal pouco ou nada mudou desde 2005, quando o ministro Humberto Costa espalhou hospitais de campanha pelas praças para a platéia ver e aplaudir. O ministro de hoje, José Gomes Temporão, que pretende tungar mais 12 bilhões de reais com a CSS, não consegue gastar nem o que lhe puseram nas mãos para investir na saúde dos brasileiros. Dos 3,7 bilhões de reais autorizados para investir até agosto de 2008, sua excelência não passou dos 387,7 milhões de reais e, dessa grana, só pagou 4,29% (158,7 milhões).
Como saúde não ocorre por mágica, o resultado está aí na vida do carioca. Os hospitais públicos estão aos pedaços. Nos últimos seis meses tornou-se conversa recorrente entre os médicos o número crescente de equipamentos quebrados – ou desregulados por falta de manutenção – em hospitais que já foram referência em determinados tratamentos. No Inca, o Instituto Nacional do Câncer, procurado por pacientes de todo o estado, as queixas são contra as máquinas de radioterapia, que queimam pacientes ou lhes deixam com efeitos colaterais muito maiores e mais graves.
Não se trata, no entanto, de fenômeno exclusivo do Inca. Os oncologistas da cidade estão preferindo encaminhar seu pacientes para Duque de Caxias, onde está instalado o mais novo (e aparentemente único) equipamento confiável no estado para irradiar tumores de cabeça. Só no final janeiro chegará o encomendado pelo hospital Quinta d’Or, da rede privada.
Outra dessas antigas referências na saúde do carioca é o HSE, o Hospital dos Servidores do Estado. Hoje, excetuada a neurocirurgia, resta escassa lembrança de qualidade nos serviços. Sem contar que as últimas direções da casa têm sido contemplativas em relação a um crime contra a população. Ao lado do hospital – e sob sua jurisdição – foi erguido um prédio chamado Instituto de Neurociências. Custou 10 milhões de reais, esteve prontinho para funcionar e nunca lhe abriram as portas. Poderia ter feito 120 cirurgias de cérebro por mês, desde 2003. Virou entulho porque foi posto em pé pela administração Serra.
O escândalo é tão grande que já atraiu a atenção da Polícia Federal. Hoje rola uma investigação que, embora não se saiba ainda onde vai bater, envolve figurões do hospital e, por enquanto, uma empresa fornecedora de equipamentos. Nada, porém, que alivie a dor do contribuinte.
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