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quinta-feira, 24 de dezembro de 2009

Construtoras dão continuidade a projetos "mundiais" ambiciosos em Dubai

Der Spiegel
Bernhard Zand
Em Dubai (Emirados Árabes Unidos)
Dubai pode estar perigosamente próximo do desastre econômico, mas alguns dos projetos mais ousados do emirado estão tendo continuidade. Embora grande parte do ambicioso arquipélago "O Mundo", composto de caros projetos imobiliários, esteja parado, um investidor austríaco afirma que em breve prosseguirá com as obras na ilha da "Alemanha".
  • AFP

    Vista áerea do projeto "World" em Dubai. Investidor austríaco Josef Kleindeinst comprou 300 ilhas e continuará com as obras

A Alemanha de Josef Kleindeinst é plana e tem cerca da metade do tamanho da sua Áustria. A sua Suécia faz fronteira com a Holanda. E, quanto à Suíça, ele diz que após a recente proibição dos minaretes muçulmanos naquele país, ele chegou a pensar em rebatizar a ilha com outro nome.

Kleindeinst, 46, comprou a metade da Europa. Mas esta Europa consiste de ilhas de areia a quatro quilômetros da costa de Dubai. Cada ilha tem o nome de um país. Kleindeinst comprou esta propriedade antes de a crise atingir Dubai. Agora ele tem nas mãos seis ilhas vazias.

Usando um terno azul, ele locomove-se entre as faixas de areia, dizendo o nome de cada uma delas. Ao sul está a França; a oeste a Inglaterra. E, bem na extremidade - que, em uma analogia geográfica, dá a impressão de ficar em algum lugar próximo ao Polo Norte -, fica a única ilha que tem palmeiras e também uma mansão. "O governante de Dubai deu esta ilha à sua mulher como presente do Dia dos Namorados", explica Kleindeinst.

Dois anos atrás, Kleindeinst comprou as últimas das 300 ilhas que compõem o seu "Mundo". Mas, depois disso, pouca coisa aconteceu neste arquipélago artificial ao largo da costa de Dubai. Kleindeinst quer mudar essa situação. E isso está chamando atenção em uma cidade que nos últimos tempos tem cancelado projetos. Quem é Kleindeinst? E o que ele quer fazer no "Mundo", um dos projetos mais bizarros já implementados pela Nakheel, a empresa de construção altamente endividada que jogou Dubai na atual crise financeira?

O projeto atraiu repórteres de várias companhias de mídia: o "Financial Times", a agência "Dow Jones" e as redes de televisão árabes "Al Jazeera" e "Al Arabiya". Todas elas pegaram o barco para as ilhas e caminharam pelo tapete vermelho que conduz à tenda de cerveja, onde os visitantes podem se empaturrar de pretzels, macarrão spätzle e strudel de damasco. Como se vê, Kleindeinst é de fato austríaco.

"Sisi", um hotel que usa energia limpa
Os primeiros projetos deverão ter início na "Alemanha". Kleindeinst pretende construir 20 mansões na ilha, que custarão entre 750 mil e três milhões de euros (U$ 1.1 milhão e US 4,3 milhões, R$ 1,9 milhão e R$ 7,6 milhões) cada. Ele já vendeu três delas, uma para um investidor sueco e duas para alemães. As obras de construção deverão começar no início do ano que vem. Os projetos foram feitos pela empresa espanhola de construção A-Cero, que construiu casas para os astros do futebol Zinedine Zidane e Ronaldo Häuser.

A seguir, na segunda fase, um hotel flutuante chamado Sylt - em uma referência à ilha e resort alemão de luxo no Mar do Norte será construído antes que as obras tenham início no resto do "continente". Haverá um "Distrito de Vida Noturna" na ilha da Holanda, um hotel "Sisi" na da Áustria, batizado em homenagem à já falecida Imperatriz da Áustria, e uma rua dotada de ar condicionado na ilha da Suécia. Ao todo, haverá 75 casas de férias, seis hotéis e seis palácios flutuantes. Todas essas instalações usarão energia solar e não produzirão emissões poluentes para a geração da sua energia, graças aos conhecimentos técnicos da Sociedade Fraunhofer, da Alemanha, um dos maiores institutos de pesquisa aplicada da Europa.

"Alguns de vocês poderão achar interessante o fato de estarmos iniciando um projeto neste momento", diz Kleindeinst. "Mas nós acreditamos nos fundamentos econômicos de Dubai". Ele observa que a cada semana chegam em Dubai 240 voos vindos da Europa. O sol é garantido no inverno. E como Dubai está apenas três fusos horários à frente da Europa, o jetlag não é um grande problema para os europeus. No ano que vem, os alemães construirão um total de 60 mil casas de férias em todo o mundo. Atualmente, os alemães já possuem 200 mil casas de férias só na Flórida.

Mercado bom para o comprador
Kleindeinst pode estar certo. Mesmo assim, desde a eclosão da crise imobiliária, cidades inteiras compostas de casas de luxo recém-construídas na Espanha estão vazias. E, em Dubai, os corretores imobiliários estão tão desesperados para vender mansões de luxo que permitirão que as pessoas vivam como reis por um preço drasticamente reduzido.

Kleindeinst tem uma resposta rápida para essas questões. Em 2003, ele próprio chegou a Dubai na condição de corretor de imóveis. Em 2006, ele vendeu algumas mansões na ilha de Palm Jumeirah por 500 mil euros (R$ 1,26 milhão) cada. Atualmente, ele está vendendo essas mansões por pelo menos o triplo daquele valor. É verdade que, na véspera da crise, no agitado verão de 2008, ele teria vendido cada uma rapidamente por três milhões de euros (R$ 7,6 milhões), mas desde então os preços dos imóveis despencaram.

Porém, em comparação com os preços de 2006, a situação ainda é bem razoável. Isso, é claro, se Dubai não quebrar completamente, fazendo com que os estrangeiros deixem o emirado em massa. Foi esse o cenário recentemente imaginado em um videogame - o Spec Ops: The Line -, lançado na semana passada em Los Angeles, e que retrata Dubai como uma cidade pós-apocalíptica, na qual as ruínas dos arranha-céus são castigadas por tempestades de areia de dimensões cataclísmicas.

Mesmo assim, Kleindeinst faz propaganda do golfe no inverno, dos torneios de rúgbi em Dubai e das corridas de Fórmula Um, enquanto o hidroavião, um Cessna Caravan, pousa no estreito entre as ilhas que representam a Inglaterra e a França e estaciona com as hélices ainda girando na ilha da Alemanha. "Podemos convidá-los agora para a nossa pequena viagem pelo mundo?", pergunta a assistente de Kleindeinst. Per, o piloto norueguês que usa bermuda e camiseta, abaixa a escada de acesso ao avião, e o primeiro grupo de viajantes levanta a bainha das calças e caminha pela água rasa até o avião.

Uma bandeira para cada ilha
Kleindeinst fez um depósito de quase 50 milhões de euros (R$ 126 milhões) pela ilhas que representam a Alemanha, a Áustria, a Suíça, a Holanda, a Suécia e São Petersburgo. Para ajudar os passageiros do avião a reconhecer as ilhas, cada uma delas é marcada com uma bandeira diferente. A visão do alto é surrealista: seis faixas de areia branca em um atlas no mar, cada qual com uma enorme bandeira no centro.

Kleindeinst diz que a ilha da Alemanha foi a primeira a proporcionar um retorno do seu investimento. Quem compra um terreno adquire também um título no cartório de imóveis de Dubai.

Kleindeinst diz também que ganhou uns bons 200 milhões de euros (R$ 504 milhões) desde 2003, e que foi "duplamente sortudo" porque também vendeu a sua carteira de ativos imediatamente antes de a crise se abater sobre a economia. Esses fundos o ajudarão agora a financiar os seus projetos para o "Mundo" com o seu próprio dinheiro até 2012. Depois disso, ele afirma que terá que obter financiamento externo. Mas, até lá, provavelmente será mais fácil obter empréstimos.

No entanto, um advogado europeu que trabalha no Golfo Pérsico encoraja bastante quem estiver interessado em investir dinheiro em Dubai a tomar muito cuidado com o que está fazendo. É fundamental que se registre a propriedade no cartório, e também é necessário que a agência de construções ou de imóveis "libere" o terreno. No caso do "Mundo", essa empresa seria a Nakheel, a companhia que fez as ilhas. A elegante frota dos barcos da companhia ainda navega pelas águas de Dubai como fazia durante o seu melhor período, mas o futuro da empresa ainda é incerto. Em um futuro muito próximo, a Nakheel terá que pagar uma dívida de US$ 4,1 bilhões (R$ 7,2 bilhões). Da mesma forma, a sua companhia associada, a Dubai World, está sentada sobre uma dívida de US$ 22 bilhões (R$ 38,7 bilhões), e atualmente não tem a menor ideia de como começará a pagá-la.

Confiança e Depressão
Há também outras questões que não foram respondidas de forma satisfatória e que os potenciais investidores em Dubai deveriam formular. Qual é o status de residência obtido pelos estrangeiros que adquirem uma casa ou propriedade em Dubai? Quais são as condições para que se transfira como herança uma casa ou propriedade em Dubai? E quando uma construtora ou um investidor tiver um litígio, com que base legal a disputa será resolvida?

"Eu não tenho nenhuma preocupação quanto às ilhas do "Mundo"", diz Alexius Goeschl, 59, um contador público certificado que assessora Kleindeinst. "Para os proprietários de iates, a situação aqui é ideal: a pessoa fica longe do tráfego das grandes cidades, mas encontra-se a apenas 15 minutos da praia. Eu adoraria comprar uma dessas mansões".

Dependendo do local de Dubai em que o indivíduo estiver atualmente, a situação pode ser ótima ou terrível. Em fevereiro, John O'Dolan, um leiloeiro e empresário que é também dono da ilha "Irlanda", suicidou-se. Ele exagerou na especulação. E agora ninguém sabe o que acontecerá com a "Irlanda", que fica a apenas algumas centenas de metros da ilha da "Alemanha".

Por outro lado, há também boas notícias, como aquela que na última segunda-feira acalmou os nervos agitados: o governo dos Emirados Árabes Unidos anunciou que está aumentando os salários dos funcionários públicos em 70%. Portanto, há algum dinheiro lá - talvez não em Dubai, mas pelo menos em Abu Dhabi, o emirado rico em petróleo que fica ao lado.

E qual será a situação de Dubai daqui para a frente? Nenhuma decisão foi ainda tomada quanto à direção exata. Mas, quando se trata de ritmo, a guarda-costeira tem uma boa sugestão: uma placa vermelha colocada no final de um quebra-mar na entrada do "Mundo" adverte aos navegantes: "Devagar".

Talvez, daqui para a frente seja melhor reduzir a velocidade pela metade - e não fazer marolas.

Tradução: UOL

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